Nuvens ralas coando o sol da manhã.Diáfanas nuvens de gaze clareando o azul em branco. Sem formas delineadas, esparsas pinceladas de um artista solto pelo céu brincando com mágico pincel de nada fazer. Tudo amplo, aberto, imaculadamente limpo e original.
A praia deserta, a maré baixa. Caminho sem esforço pela areia lavada e dura da orla rendada de água fininha.Uso colares de sementes feito pelos índios Pataxós.Levo livros.
Livros pesam, mas fazer o quê, são meu destino e meu ofício. Leio o que me aparece, normalmente de quatro a cinco livros que vou espalhando pela casa, pelas bolsas, pela cabeça. Trouxe comigo um Tom Wolfe, "Um homem por inteiro".Um paralelepípedo de 662 páginas, lançado em 1999, semelhante a sociedade brasileira atual que com atraso se espelha nas americanices do norte. Os exageros, as esquisitices e as excentricidades de um bilionário enfrentando a falência enquanto a família,a segunda mulher e agregados consomem suas últimas forças em gastos perpétuos e estapafúrdios da vida americana,.As favelas da cidade,os astros do esporte, a fazenda de 12mil hectares só para caçar codornas. O cenário é a cidade de Atlanta na Georgia.
Vou ao mar, ao horizonte, ao castelo das crianças, a Shangri-lá , ao rumo sem rumo que me conduz a esta prosa que deito na folha do caderno preto.
De onde me vem este gosto encantado por ficar só?
Liberdade é o patrimônio que preservo , onde me reconheço forte, independente, em totalidade- Sou o siri,a lesma brilhante, o pirilampo da noite, esta mulher nua que entende de se isolar para se pertencer, se alegrar com ondas que quebram, com mergulhos e águas de curar.
É tão bom ser agora o meu destino. Ser coragem suada de tanto caminhar. Ter o ânimo nutrido pelo livro de orações que carrego na bolsa- aqui Jesus me faz companhia, meu Jesus doador de graças e amor, um profundo amor que atravessa em compaixão os tempos. Banhada em luz na decomposição do espectro solar de cor rubi e dourado sou ouro da existência abrasada em amor. A esta hora o sol já vai pelo meio do céu e as pessoas transitam molemente pela praia.O cão labrador busca o pedaço de madeira, outro, um vira lata se lança na água atrás da casca de coco. Mais abaixo crianças fazem guerra de areia e o mar engole seus castelos.
A vida passa.
O minuto se desmancha enquanto o escrevo. A paisagem é dinâmica e se transforma num quadro vivo.
O sol faz-se ardido.
Espalho livros pela areia.
O trote do cavalo manso e o homem magro com chapéu de cangaço.
O mar recua .Ondas mansas.
Vai e volta o andante cavalo branco sujo.
As frases soltas se organizam em pensamento sem pensar.
Vida mansa é simplesmente estar.
Faço parte deste mundo em que o "estar lá fora" é ser feliz "aqui dentro", vibrando por fazer parte deste cenário dos deuses. Aqui, este aqui que eu falo agora é um lugar que só a mim pertence, onde não ouço o celular tocar, um "deixa estar". O corpo se entrega, os nervos sem tensão, o músculos dormitam na camada húmida da areia quente. A vida está ligada e passando, apenas testemunho. Ouvinte do marulhar, gerando um campo magnético imaculado, alheio a estreititude do chegar humano. De olhos cerrados, tudo existe apenas em uma névoa e não distingo o que é miragem e o que me vem de memória em paisagem. Coração quieto.
Um marulhar ... coração quieto.
Nunca nada é o fim do mundo.
O mundo é eterno, nós é que somos passageiros.